Dividir tarefas, ter perfis complementares e confiança o suficiente para não precisar perder tempo discutindo a relação. O que parece ser uma receita para integrantes de um casamento perfeito pode ser aplicado para sócios de empresas bem-sucedidas. É o que garantem especialistas em gestão e parceiros de negócios juntos há mais de 20 anos. Para eles, o segredo das sociedades longevas passa por definição de metas conjuntas, respeito às opiniões alheias e consenso nas decisões mais estratégicas. Isso significa colocar os interesses da organização acima da vontade de cada sócio para as relações profissionais não azedarem.
Na Módulo Security Solutions, com sede no Rio de Janeiro, os três sócios-fundadores – Alberto Bastos, Álvaro Lima e Fernando Nery – estão juntos há 28 anos. Conheceram-se na faculdade de informática da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e resolveram criar a empresa de tecnologia da informação (TI), hoje com 400 funcionários e escritórios em Atlanta, Londres e Mumbai. “Apesar da mesma formação profissional, temos perfis diferentes, mas complementares”, diz Bastos, diretor de tecnologias e alianças.
Segundo o executivo, que se considera conciliador, Lima é arrojado e toma decisões imediatas, enquanto Nery é mais pragmático, sendo o responsável pelo contato com os clientes. Recentemente, para preparar a companhia para a expansão internacional, o grupo contratou um CEO, Sérgio Thompson-Flores. “Sociedade é como um casamento. A relação precisa ser cultivada”, compara Bastos. “A definição de uma visão comum, para saber para onde ir e como se quer chegar, é fundamental.”
Para o executivo, o segredo da união perfeita também inclui dedicar mais energia para atingir metas e menos para “discutir a relação”. “A maior armadilha para uma sociedade é quando há conflitos de interesse ou falta confiança entre as partes”. Esse modelo, afinal, exige uma preocupação constante entre os sócios e negociações pontuais a cada nova situação que surge no caminho. “Em muitos casos, é preciso ceder em busca de um bem maior para a organização.”
Bastos diz que, quando um dos sócios, depois de muita discussão, abre mão de uma posição que defendia, costuma adotar a expressão “eu me alinho”, ao invés de dizer que foi “voto vencido”. Os três parceiros já enfrentaram crises financeiras durante os planos econômicos do governo Collor, o estouro da bolha da internet e, diariamente, a corrida contra o tempo que toda companhia de TI precisa vencer em novos processos e soluções. “Não são os mais fortes que sobrevivem no mercado, mas aqueles com uma maior capacidade de adaptação”, ressalta.
Para Wagner Luiz Teixeira, sócio-diretor da consultoria höft, o alicerce das parcerias sólidas deve misturar respeito entre os gestores, responsabilidades bem definidas e um alinhamento da visão de futuro. “Trate o seu sócio como gostaria de ser tratado”, diz. “Para conviver em harmonia por tanto tempo, devem-se combinar as regras do jogo e agir conforme o que foi acertado.”
As sugestões de Teixeira são seguidas à risca pelas sócias Sandra Soares Costa e Janete Vaz, respectivamente presidente e vice-presidente do conselho do Laboratório Sabin, com 1,8 mil colaboradores. As duas trabalham juntas há 29 anos, desde a fundação da empresa, em Brasília (DF). “Procuramos investir nas habilidades que cada uma possui para executar as tarefas”, diz Janete. “O maior erro é não saber ouvir e desrespeitar os limites da outra.”
Para chegar a um consenso sobre estratégias, investimentos e novos negócios, a dupla costuma consultar os líderes das equipes envolvidas e, quando necessário, contrata uma consultoria para avaliar a situação. “Com os relatórios em mãos, sentamos para buscar uma solução em conjunto”. Sandra lembra que, quando abriram a companhia, as duas, bioquímicas de formação, “resolviam de tudo”. Mas, com o crescimento da empresa, acertaram uma partilha de afazeres e investiram em capacitação e desenvolvimento. “Cada uma assumiu áreas com as quais mais se identificava”, diz.
Janete ganhou os setores administrativo-financeiro e de gestão de pessoas, enquanto Sandra pilota os departamentos técnicos, de inovação e pesquisa. Para que o laboratório, hoje com mais de cem unidades, siga seu rumo independentemente da presença das líderes, elas deram início a um projeto de governança corporativa. No ano passado, o grupo Sabin faturou R$ 250 milhões. A previsão para 2013 é crescer 30%.
Segundo o consultor Artur Lopes, da Artur Lopes & Associados e autor do livro “Quem Matar na Hora da Crise – Como Resgatar a Sua Empresa e Fazê-la Crescer” (Ed. Évora), as alianças ganham força com a implementação de uma gestão profissional que preserve o interesse coletivo diante das vontades dos sócios. “É importante compor acordos de acionistas e atos constitutivos que disciplinem os direitos e deveres dos detentores da organização”, diz. De acordo com ele, além de afinidades no plano pessoal, a boa convivência também será pautada pela criação de mecanismos para a solução de conflitos.
Lopes aconselha que as decisões estratégicas sejam resolvidas sempre por consenso, para evitar rupturas. “Mas, na ausência de concordância absoluta, o contrato social ou o estatuto devem dispor sobre os destinos do empreendimento.”
Sócios desde o início da AxisMed, em 2002, os executivos Fábio de Souza Abreu e Fábio Boihagian viram a empresa que criaram ser comprada pela Telefônica, no início de 2013. A sociedade, no entanto, continua de pé. As primeiras dificuldades para tirar a companhia do papel também ajudaram a fortalecer os laços dos integrantes.
Abreu lembra que a criação do plano de negócios começou em maio de 2011, com a ajuda de Boihagian, administrador com ênfase em gestão de saúde, e do médico Álvaro Coutinho, já falecido. Seis meses depois e com um dossiê de 150 páginas debaixo do braço, Abreu bateu nas portas do mercado financeiro e de empresários da área médica, em busca de apoio, sem sucesso. Acabou conseguindo um aporte de R$ 2,5 milhões com investidores-anjos, o que garantiu o início das operações.
Hoje, a companhia especializada em programas de prevenção de saúde tem 195 mil credenciados. Abreu afirma que a separação de tarefas foi importante. “Todo funcionário tem uma função clara e metas a serem atingidas e isso também vale para nós, sócios. Além disso, é necessário saber ouvir os parceiros e controlar o ego”, ressalta.
Fonte: Jacilio Saraiva/Valor Econômico