A questão dos planos de saúde privados no país é dramática, consequente das deficiências da própria lei que criou o sistema e da grave crise que assola o Brasil.
Não é segredo que, ao longo dos últimos três anos, as operadoras de planos de saúde privados perderam mais de 3 milhões de vidas. Também não é segredo que isso teve um impacto grande na rede pública, com o SUS assumindo o atendimento dessa massa de pessoas sem a contrapartida do aumento de seus recursos. Como não poderia deixar de ser, o resultado foi ruim para todos.
Os dois movimentos afetaram milhões de pessoas, que tiveram suas condições de saúde agravadas pelo aumento do congestionamento da rede pública, pela demora no atendimento e pela falta de condições do SUS prestar assistência no momento necessário, postergando intervenções muitas vezes indispensáveis para preservar a vida dos pacientes.
Mas se as pessoas foram diretamente afetadas, o SUS e as operadoras de planos de saúde privados também o foram, e severamente. Os dois sistemas sentiram o impacto da crise no caixa, na capacidade de prestar atendimento e na deterioração de seus números.
No sistema de saúde privado houve a queda do faturamento e o aumento da sinistralidade. Movimento lógico. Ao perceber que a possibilidade da perda do benefício é concreta, é humano antecipar a utilização do plano de saúde para examinar, descobrir e tratar todo e qualquer problema real ou imaginário, incluídos os que não eram conhecidos.
De acordo com números da FENASAÚDE, a Federação Nacional das Operadoras de Planos de Saúde Privados, o resultado industrial do negócio ficou em 102%, ou seja, como o faturamento representa um máximo de 100 pontos, os planos de saúde privados tiveram prejuízo na operação direta.
A sinistralidade em alta é um dado negativo em qualquer circunstância, mas ele fica pior num cenário em que as despesas administrativas e comerciais já foram espremidas ao máximo, não sobrando gordura para mais cortes.
A sinistralidade dos planos passou a casa dos 80% e não há nada que indique uma queda, seja pelo aumento do faturamento pelo ingresso de novos segurados, seja pela redução do atendimento, seja pela melhora nos resultados.
O aumento autorizado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) para os planos individuais foi de pouco mais de 13%. De acordo com dados fornecidos pelo IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar) a inflação da saúde no mesmo período foi de mais de 19%. Esta conta não fecha e explica porque grande parte das operadoras simplesmente deixou de oferecer planos individuais e familiares.
O cenário de curto prazo é dramático para dezenas de operadoras pequenas, que não têm massa crítica para encarar a crise. Não há como elas sobreviverem enfrentando o aumento dos custos e a redução das despesas. Mas não são apenas elas que enfrentam dificuldades. Algumas operadoras de maior porte também não estão dando conta do recado. Até os dirigentes das grandes operadoras nacionais estão preocupados.
A retomada do crescimento é crucial para se evitar o agravamento da situação. O país ainda tem 14 milhões de desempregados e outros milhões de subempregados. Enquanto esta situação persistir, não há o que fazer. Tanto as operadoras de planos privados como o SUS amargarão dias muito difíceis, inclusive com resultados negativos, e até a eventual deterioração das condições de atendimento.
Como no longo prazo o sistema de saúde privado tem data para acabar, em função de deficiências na própria lei que o criou, sobra o médio prazo para as operadoras se refazerem da crise e ganharem fôlego para aprovar as modificações legais indispensáveis para sua sobrevivência e para o bom atendimento da população.
Até lá, especialmente enquanto a crise atual permanece, é indispensável a gestão do negócio ser feita com foco integral na sintonia fina da operação. Se, de um lado, é inadmissível que o atendimento seja prejudicado, de outro, é fundamental o controle de cada custo, por menor que seja. Sem isso, o risco de quebra cresce significativamente.
Fonte: Antonio Penteado Mendonça / Estadão