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Os consumidores de planos de saúde individuais e familiares devem preparar o bolso. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) autorizou ontem o reajuste de até 13,57% para esses tipos de convênios, que atendem cerca de 8,3 milhões de pessoas, o que representa, segundo a autarquia, 17% do total de beneficiários no país. A correção — a maior concedida em toda a série histórica — sobre as mensalidades será repassada pelas operadoras a partir da data de aniversário dos respectivos contratos, devendo ser igual ou inferior ao índice fixado.

Quem já está fazendo as contas e calculando o quanto pagará a mais pelo plano de saúde é a advogada Débora Raposo, 34 anos. A mensalidade atual, de R$ 774, poderá subir para até R$ 879 se a empresa gestora do convênio aplicar o reajuste cheio, de 13,57%. “Se confirmado, pagaria mensalmente R$ 105 a mais do que o desembolso atual. É abusivo”, criticou. Para ela, é um valor alto por uma prestação limitada de serviços. “No meu plano, há muita restrição de hospitais conveniados. Em casos emergenciais, por exemplo, só tem quatro em Brasília que podem me atender”, reclamou.

Diante do cenário de calamidade dos hospitais públicos, Débora não cogita o cancelamento do plano. Mas vai cortar despesas para manter o convênio. “A saúde é prioridade. Infelizmente, eu e minha filha precisamos de um plano de saúde. Então, vou evitar ir a restaurantes e gastar menos com lazer. Como não são minhas prioridades, eu vou ter que tirar”, analisou ela, que protestou contra o reajuste. “A impressão que tenho é que a ANS não tem beneficiado o consumidor, apenas as empresas, porque a gente sabe que a situação não está legal. Os hospitais estão lotados. Nós sabemos que depender do Sistema Único de Saúde (SUS) é complicado”, disse.

O motorista Vágner Jacinto Tavares, 44, considera o reajuste alto para um serviço que está aquém do oferecido. “Eles nunca colocam a verdade no que vão disponibilizar. O atendimento não é completo e, com o preço que se pede, seria necessário uma prestação melhor”, justificou ele, que paga R$ 1,2 mil. “Eu já estava insatisfeito antes. Agora, com esse novo aumento, eu vou ficar ainda mais. Eu não me importaria em pagar o valor se o serviço não fosse burocrático e incompleto.”

Aniversário

É importante que os consumidores fiquem atentos ao mês de aniversário da apólice. Como o reajuste foi autorizado ontem pela ANS — e a correção autorizada no ano passado, de 13,55%, durou até abril —, os contratos que fizeram aniversário findados em maio e junho pagarão a mensalidade reajustada e mais um valor retroativo, conforme prevê a Resolução Normativa nº 171/2008. No caso dos contratos vencidos em maio, o retroativo será cobrado durante os meses de julho e agosto. A cobrança retroativa não deve ser feita a contratos com aniversário entre julho e abril de 2017.

Já os acordos encerrados em junho, o retroativo incidirá apenas em julho. É o exemplo do contrato da servidora pública Suzana de Souza Jorge, 50, que faz aniversário este mês. Ela, que paga mensalidade de R$ 1,2 mil, passará a gastar R$ 1.362,84 pelo convênio a partir de agosto se o plano aplicar o teto máximo estabelecido pela ANS. Mas, em julho, ela pagará o preço reajustado da fatura, além do valor retroativo, de R$ 162,84, totalizando em R$ 1.525,68.

Para Suzana, o valor alto não condiz com os serviços prestados. “Cada vez mais, meu plano cobre menos hospitais. Tenho que peregrinar, ir em vários lugares porque a cobertura não atende quase nada”, protestou. Apesar de pagar caro pelo convênio e não aprovar os serviços oferecidos, ela também não pretende abandonar o plano de saúde. “A gente tem que pagar. Se não tiver plano de saúde, é morte na certa. E isso é uma vergonha, porque a gente paga tantos impostos para receber um atendimento precário e filas de esperas gigantes nos hospitais públicos”, criticou.

Inflação

O reajuste vai pressionar a inflação. Se o aumento for aplicado integralmente pelas operadoras, o custo médio com planos de saúde representará um acréscimo de 0,45 ponto percentual sobre o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ao fim de 2016, prevê o economista-sênior da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Fábio Bentes.

Isso significa que, se a inflação cravar em 7,06% ao fim deste ano, 0,45 ponto percentual será atribuído aos gastos com os convênios. O reajuste, na opinião de Bentes, dificulta o trabalho do Banco Central (BC) de cortar a taxa básica de juros (Selic) ainda no início do segundo semestre, como previa o mercado financeiro. “É uma correção que realmente coloca mais lenha da fogueira na inflação e leva a autoridade monetária a ter menos incentivo para reduzir os juros”, avaliou.

Apesar de pesar no bolso dos consumidores, a correção é insuficiente para equilibrar as contas das operadoras, segundo avalia a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde). “Não acompanha os custos da saúde que continuam a crescer substancialmente”, justificou. A entidade alega que, a inflação médica no Brasil — que retrata a variação da despesa assistencial per capita — alcança, em média, patamar duas vezes superior à inflação geral. “De 2007 a 2015, IPCA acumulou alta de 64,5%, enquanto a despesa assistencial per capita cresceu 129,2%.”

Dessa forma, a FenaSaúde entende que os percentuais de correção definidos pela ANS não cobrem sequer as despesas assistenciais dos planos. “Por isso, é preciso focar na questão da alta dos custos, sob pena de o sistema se tornar economicamente inviável num futuro bem próximo”, ressaltou a presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz Palheiro Mendes. A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) comunicou que, atualmente, a margem operacional média das operadoras de planos de saúde é de 0,6%.

35 convênios suspensos

Abusos contra os consumidores de planos de saúde cometidos ao longo do primeiro trimestre do ano não passaram em branco. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) suspendeu ontem temporariamente a comercialização de 35 convênios de um total de oito operadoras. A decisão foi tomada com base em 12.022 queixas consideradas como procedentes pelo Programa de Monitoramento da Garantia de Atendimento.

Juntos, os planos de saúde possuem 272 mil conveniados. A decisão da ANS, no entanto, não interfere em nada na utilização do benefício, ressalta a autarquia. “Os clientes continuam a ter a assistência regular a que têm direito, ficando protegidos com a medida, uma vez que as operadoras terão que resolver os problemas assistenciais para que possam receber novos beneficiários”, comunicou.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) — entidade representativa de operadoras de planos e seguros de assistência à saúde — ressaltou ter associadas com a comercialização de planos suspensas. A entidade, no entanto, reforçou confiar “que o processo será constantemente aperfeiçoado, sempre em benefício dos consumidores e a fim de afastar distorções no processo de avaliação que prejudiquem o desenvolvimento do mercado e o pleno funcionamento do sistema”.

A  FenaSaúde ainda destaca que, no setor, a avaliação deve ser transparente, de forma que retrate a realidade da prestação dos serviços. “A fiscalização pelos órgãos reguladores oficiais é importante em todos os segmentos econômicos, para que a qualidade de atendimento aos consumidores seja preservada e a concorrência, estimulada”, ressaltou.

Fonte: Correio Braziliense