Médicos gostam de política. Historicamente, sempre participamos deste ambiente, contribuindo para o desenvolvimento humano e científico da sociedade. Não podemos esquecer que um médico deixou o estetoscópio de lado para, com outros instrumentos, chegar à Presidência e construir Brasília dentro de um ousado Plano de Metas — 50 anos em cinco. Inaugurada em 1960, a hoje cidade-síntese de JK está aí, viva, pulsante, politicamente ativa — para o bem ou para o mal.
Mas, independentemente da classe médica, a saúde do Brasil e dos brasileiros tem ocupado nos últimos anos lugar de destaque na pauta das soluções para destravar o país nos aspectos sociais, econômicos e políticos. De passagem, vale lembrar a profética máxima do livro “Macunaíma”, escrito em 1928 pelo modernista Mário de Andrade: “Pouca saúde e muita saúva, os males do Brasil são”. As saúvas continuam soltas, devorando o sistema de saúde.
Portanto, nós, médicos, não podemos nos furtar ao debate em defesa da nossa profissão e da medicina brasileira. A PEC do teto dos gastos é um exemplo vivo à nossa frente. Não há dúvida de que medidas para conter os gastos públicos são necessárias e urgentes. Mas a PEC é apenas um primeiro passo de um longo caminho de recuperação econômica. Isoladamente, não resolverá a questão. Para que a iniciativa vingue, é preciso encarar efetivamente problemas sistêmicos de grandes dimensões, como as reformas previdenciária e política, a instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas e a gestão eficiente das receitas. Sobre o congelamento do orçamento da Saúde, consideramos um equívoco a indexação do piso de investimentos à inflação medida pelo IPCA, uma vez que a inflação médica — medida pela Variação dos Custos Médicos e Hospitalares (VCMH) — é sempre muito superior à inflação oficial (isso em todo o mundo).
O Brasil precisa voltar a crescer, isso é fato, mas é necessário garantir no Congresso um crescimento justo do orçamento da Saúde para não agravar ainda mais o crítico quadro do setor, que já sofre de subinvestimento crônico.
Preocupa-nos também a fórmula de cálculo do investimento federal mínimo em saúde a partir de 2018, uma vez que os 15% das receitas líquidas, baseados no ano de 2017, não alcançarão os investimentos praticados em 2014/2015, ou seja: há risco de regressão sim, com agravamento dos sérios problemas da saúde pública. A PEC sinaliza a possibilidade de repasses entre áreas pela regra de Desvinculação de Receitas da União (DRU). Porém, o instrumento precisa blindar o orçamento da Saúde para que não sofra desfalques e, ao contrário, seja realmente prioritário na fila de repasses.
O maior desafio de todos nós (entidades, médicos, parlamentares vinculados ao setor) é contribuir para a retomada do crescimento e, ao mesmo tempo, defender a Saúde com “unhas e dentes”. Essa também é a principal missão da Frente Parlamentar da Medicina. Afinal, saúde é a base da vida.
Fonte: O Globo