Gastos com planos de saúde privados melhoram a qualidade e a agilidade de atendimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), defende o ministro Ricardo Barros. A favor da criação dos chamados planos populares — de cobertura e custo reduzidos — ele sustenta que esse mercado deveria ser livre, incluindo o reajuste das mensalidades dos planos individuais atualmente reguladas pelo governo.
— Tudo o que puder ser financiado ou cofinanciado pelo cidadão (pela participação em exames e atendimentos junto ao plano de saúde), alivia o SUS, melhora o atendimento, que fica menos demorado principalmente para quem depende 100% sistema público.
Barros participou do primeiro de uma série de três debates sobre novos modelos para saúde no Brasil, com patrocínio da Amil, apoio da Revista Época e realizado pelo GLOBO na manhã desta terça-feira no Museu de Arte do Rio. O evento reuniu também Claudio Lottenberg, presidente do UnitedHealth Group Brasil, Lígia Bahia, professora da UFRJ, e Luiz Augusto Carneiro, superintendente do Instituto de Estudos em Saúde Suplementar (IESS), com mediação de Luciana Casemiro, editora da seção Defesa do Consumidor.
O ministro, que falou sobre o papel do governo e dos principais desafios da saúde pública, destacou que 150 milhões de brasileiros dependem do SUS ou 70% da população do país, consumindo R$ 246 bilhões em investimento em 2016. Enquanto o segmento de planos de saúde, com 47,5 milhões de beneficiários, movimenta mais de R$ 160 bilhões por anualmente.
A criação dos planos de saúde populares, em discussão no Congresso, foi citada por ele como uma opção ao momento macroeconômico do país.
— Quase três milhões de brasileiros perderam seus planos de saúde com a crise, e se discute a possibilidade de dar a eles a opção de retomar a cobertura com planos de saúde acessíveis — explicou Barros. — Eu defendo que as pessoas possam pagar o que têm capacidade de pagar. Plano de saúde é um contrato de um consumidor com um fornecedor. Se o atendimento não estiver bom, a pessoa sai do plano. Ninguém é obrigado a ficar no plano. Não tem por que regular. É mercado. “Mas e o reajuste?”. É mercado. Se subir muito (o preço), perde o cliente. Se não subir, quebra.
O ministro destaca, porém, que há questões a serem resolvidas, como a questão do ressarcimento ao SUS cobrado das operadoras de saúde pelo atendimento de seus beneficiários pelo sistema público.
— O ressarcimento é um problema porque é judicializado. Eu já pedi à ANS para que nosso sistema (de entrada no SUS) seja disponibilizado aos planos. Se um segurado entrar na rede pública, deve ser removido. Se não for removido, defendo que seja pactuado o que ocorre dali em diante. Se fizer tal procedimento, o valor é este e está resolvido — opina Barros, destacando que todos têm direito ao SUS, daí esse atendimento ter de ser regulado.
Desde 2001, foram realizados 3,8 milhões de atendimentos de usuários de planos pelo SUS, gerando um custo de R$ 6,6 bilhões. Até março de 2017, 2,3 milhões de atendimentos foram considerados passíveis de ressarcimento, com custo de R$ 3,7 bilhões. O restante está em processo judicial.
RESULTADO NÃO DEPENDE SÓ DE DINHEIRO
Claudio Lottenberg, do UnitedHealth Group Brasil, chamou atenção para o impacto da tecnologia na composição dos custos do setor de saúde. Ele ressaltou que a tecnologia agrega custos, mas nem sempre agrega valor.
— O uso da tecnologia não é só instrumental, mas processual. Precisamos saber usar de forma adequada e não exageradamente. Coisas simples, como o termômetro e a radiografia , são tecnologia, não são caras e são extremamente eficientes. É preciso pensar em qualidade de atendimento.
Como exemplo, citou o caso dos EUA, onde as novas tecnologias são incorporadas automaticamente ao sistema de saúde, que consome valor equivalente a quase 20% do PIB em investimentos. O resultado são indicadores de qualidade de vida inferiores aos registrados na Europa, onde o aporte em saúde varia entre 10% a 12% do PIB.
O envelhecimento da população seria outro fator a onerar os planos de saúde, afetando as necessidades de tratamento e financiamento.
Para discutir as questões financeiras, contudo, defende Lottenberg, é preciso debater questões mais prevalentes:
— É muito ruim discutir saúde falando apenas de dinheiro. Não adianta encharcar o sistema de dinheiro. A rigor não se trata de politizar a conversa, mas tem que haver debate, sem radicalismos. Tudo o que pudermos trazer para aportar recursos para a saúde merece ser debatido.
O equilíbrio entre a saúde pública e privada passa pela definição de prioridades, pondera Lígia Bahia, professora da UFRJ.
— Os planos desoneram o SUS? Pode ser, mas isso não pode ser interpretado como garantia de atenção e de qualidade de atendimento. Existe uma crise econômica e cortes públicos na saúde, mas isso não pode ser interpretado como se as famílias fossem ter mais folga nos seus orçamentos domésticos para pagar plano privado. E se, com menos clientes as operadoras vão quebrar, não se pode interpretar que o governo tem de intervir — defende Lígia.
Mudanças nos modelos de remuneração de profissionais e estabelecimentos de saúde foram levantadas por Luiz Augusto Carneiro do IESS. Segundo ele, o fee for service (pagamento por serviço) modelo mais adotado no Brasil, estimula o desperdício de recursos. O ideal seria adotar o pagamento por diagnóstico.
— O ônus das fraudes e desperdícios na saúde suplementar foi de R$ 22,5 bilhões em 2015, o equivalente a 19% do total das despesas assistenciais de R$ 120 bilhões. Em 2016, esse número será maior — diz Carneiro.
Os próximos debates serão realizados nos dias 19 de setembro, sobre o novo modelo de assistência e de remuneração, e 17 de outubro, sobre novos formatos e modalidades de pagamento de planos de saúde.
Fonte: Extra