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Nem o presidente Alexandre Abreu escapou da sabatina dos funcionários no programa Roda Viva BB. O projeto do Banco do Brasil é gravado no estúdio da TV Cultura, no mesmo cenário e com a mesma equipe da versão original, que inclui até a participação do cartunista Paulo Caruso, que faz a caricatura do participante.

O objetivo da iniciativa, realizada mensalmente há três anos, é aproximar funcionários de diversas regiões do país dos diretores do banco ou convidados em um ambiente sem censura. Durante o programa é possível fazer perguntas livremente sobre temas diversos, que podem versar sobre negociação coletiva até como são definidos o orçamento e as metas do banco. A exibição ocorre na íntegra em todas as agências.

A ideia do Roda Viva BB surgiu na agência interna de notícias do banco, criada para receber comentários e sugestões dos funcionários tanto para melhoria de produtos como de processos. A intenção é aprimorar a comunicação usando novas ferramentas que fogem dos tradicionais murais e jornais impressos.

Muitas companhias têm se esforçado para melhorar essa aproximação via comunicados intranet, blogs, caixas de sugestões, ouvidoria, café com presidente e até implementando políticas de portas abertas. Mas nem todas conseguem atingir o resultado esperado, e a criatividade ajuda muito nessa tarefa.

O Banco do Brasil está se empenhando para ampliar essa “conversa” com seus quase 40 mil funcionários. Além do Roda Viva BB, a instituição reinventou um programa já bastante disseminado nas empresas, o banco de ideias, ali batizado de Pensa BB. A fase inicial é semelhante ao modelo tradicional: funcionários apresentam ideias e aquelas consideradas mais promissoras chegam à final – na edição em andamento, a primeira depois do piloto, foram selecionadas 58 ideias entre as 3.265 inscritas.

O diferencial ocorre a partir daí: os funcionários do banco são convidados a participar ativamente do processo de aprimoramento e escolha das ideias vencedoras. Mais de 39 mil aceitaram o convite e, em um processo que mescla o apelo dos games ao das bolsas de valores, receberam moedas virtuais para “investir” nos projetos que julgam mais promissores.

Cada projeto vai obtendo pontuações com base em critérios como pontualidade na entrega do plano de ação e número de investidores que apostam na ideia, e tudo isso pode aumentar o capital dos participantes. Outra forma de multiplicar o valor recebido inicialmente é fazer sugestões de aprimoramento nos projetos. No final, os proponentes dos três projetos vencedores ganham o direito de fazer um curso de inovação na Columbia University, nos Estados Unidos, enquanto os participantes podem trocar o capital acumulado por prêmios que correspondem à pontuação obtida.

Na edição piloto do programa, a ideia vencedora foi a criação de um portal de renegociação de dívidas, opção on-line para esse tipo de processo. Depois de implantada, a inovação já rendeu R$ 1,5 bilhão em dívidas renegociadas. Os benefícios, contudo, não se limitam aos financeiros e o banco percebeu repercussão direta nas percepções dos funcionários sobre o ambiente de trabalho. “O tema da pesquisa de clima que mais evoluiu em aprovação depois da criação do Pensa BB foi justamente abertura para inovação e novas ideias”, descreve o diretor de gestão de pessoas, Carlos Netto.

Para ele, uma das lições trazidas pela experiência é o reforço do conceito de que o poder está cada vez menos nos indivíduos, independentemente dos cargos que ocupam, e sim nas equipes. “Conquistar a adesão genuína das pessoas com quem se trabalha é o grande desafio para os líderes, e isso depende em grande parte da capacidade de ouvir”, diz Netto. “Cabe à empresa, institucionalmente, dar claros sinais de que esse movimento precisa acontecer e oferecer as ferramentas necessárias”, acrescenta.

Na maior parte das organizações, as pesquisas de clima mostram que os “problemas de comunicação interna” ainda estão no topo das críticas. Essa é uma evidência de que continua existindo uma barreira, ou ao menos um forte ruído, no percurso entre a emissão e o processamento das informações pelos receptores.

Enquanto isso, a famosa “rádio peão” opera em potência máxima, passando adiante notícias deturpadas, boatos e fofocas – o que só ocorre pela desconfiança de que a empresa não é tão transparente quanto deveria e que há sempre histórias se desenrolando “nos bastidores”.

Quem estuda o assunto identificou que a chave do problema está no conceito, ainda predominante, de que a comunicação nas empresas é um processo que se realiza de cima para baixo. Em vez disso, ela precisa ser uma troca, em que informações, percepções e opiniões possam fluir livremente em mão dupla. “A comunicação empresarial tradicional deve dar lugar a um processo mais dinâmico e sofisticado. E o mais importante: esse processo deve ser fundado no diálogo”, preconizam o professor de administração na Harvard Business School, Boris Groysberg, e o consultor de comunicação Michael Slind, autores do livro “Talk, Inc.”

Groysberg e Slind estudaram o estado da arte da comunicação organizacional durante dois anos, ouvindo profissionais envolvidos na missão em grandes empresas originárias dos Estados Unidos e de outros países, e publicaram suas conclusões em artigo na Harvard Business Review. A partir disso, criaram um modelo, batizado de Diálogo Organizacional, baseado em quatro elementos – intimidade, interatividade, inclusão e intencionalidade – que tendem a se reforçar mutuamente e convergir para um processo integrado.

“Descobrimos que, hoje em dia, a forma de contato do líder inteligente com o trabalhador é mais parecida a uma conversa comum entre duas pessoas do que uma série de ordens disparadas do alto. Além disso, o líder adota práticas e promove normas culturais que infundem a organização inteira de uma predisposição para o diálogo”, descrevem. O que estaria faltando à maior parte das empresas, portanto, é fomentar um ambiente que as pessoas se sintam realmente à vontade para expressar o que pensam e se considerem verdadeiramente ouvidas.

As expectativas das novas gerações por maior abertura e flexibilidade na relação com o empregador reforçam a necessidade de mais transparência na comunicação. Com 72% da equipe pertencente às gerações Y – ou seja, nascidos depois de 1980 -, a SAP Labs Latin America, sediada em São Leopoldo (RS), viu seu ambiente de trabalho passar por uma verdadeira revolução nos últimos quatro anos. A empresa chegou a se tornar referência na área de gestão de pessoas, depois que os funcionários foram convocados para resolver os problemas que eles próprios apontavam nas pesquisas de clima, incluindo as tais “dificuldades de comunicação”.

“Os planos de ação para os itens com maiores índices de descontentamento passaram a ser elaborados coletivamente, em vez de pensados e apresentados exclusivamente pela empresa”, explica a diretora de recursos humanos, Adriana Kersting. “Dessa forma, melhorar a comunicação e o clima de trabalho passou a ser uma responsabilidade compartilhada por todos, com ações implementadas a partir de sugestões da própria equipe ou amadurecidas em conjunto. Isso fez toda a diferença”, afirma.

A começar pelo ambiente descontraído e repleto de espaços de aproximação, incluindo seis “coffee corners” que possibilitam aos funcionários interagir com colegas de outros setores, tudo na SAP tem sido feito para incentivar a forma mais antiga e, ao mesmo tempo, mais eficaz de comunicação: a conversa olho no olho.

Já o sistema de avaliação de desempenho 360 graus, em que o funcionário é avaliado por pares, superiores e subordinados, ganhou uma versão mais ampla, o Projeto 720. São avaliações que duplas de funcionários de setores diferentes fazem um do outro. Para isso, conversam com dez pessoas indicadas pelo colega – cinco do ambiente de trabalho e cinco ligados à vida fora da empresa.

O diagnóstico que resulta dessa verdadeira investigação é apresentado exclusivamente ao colega envolvido, em bate-papos que costumam mexer bastante com as emoções. “Além do aprendizado que esse projeto proporciona a cada um, incluindo a capacidade para dar e receber feedback, o programa tem contribuído para aumentar a integração e a confiança entre os setores”, diz Adriana.

Na Elektro, oitava maior distribuidora de energia elétrica do Brasil, com 2,4 milhões de clientes nos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, uma série de programas também vêm sendo criados ou aperfeiçoados com o propósito de fomentar o hábito de falar e de ouvir no cotidiano do trabalho. A empresa criou uma rotina diária de conversas nas equipes, os Diálogos Estratégicos de Segurança e Comportamento (Desc), que tratam dos mais diversos assuntos em bate-papos rápidos.

Nas reuniões semanais de diretoria, as manhãs são reservadas a pautas previamente definidas e as tardes passaram a ficar livres para temas sugeridos pelos funcionários. Já o programa Papo-Expresso, em que funcionários se inscrevem para conversar com o presidente, ganhou uma variante que aumentou a imprevisibilidade dos assuntos tratados nessas ocasiões: o Papo-Expresso Família, em que familiares dos funcionários entram da conversa. “A primeira pergunta que um filho de funcionário fez foi para qual time o presidente torce. Isso quebrou o gelo de imediato”, conta a gerente de recursos humanos, Noemi Oga.

Fonte: Valor Econômico